Geomagnetismo: mais que a bússola


Indice
O Dínamo Terrestre
Inversões Magnéticas
O escudo magnético

A harmonia e a ordem que observamos no Céu são o resultado de apenas uma única interação que chamamos de Força Gravitacional. A Gravitação dos corpos cria, além das órbitas de planetas, cometas e asteróides, as maravilhosas formas dos aglomerados estelares, das galáxias, e mesmo dos aglomerados de galáxias, atuando a distâncias incrivelmente grandes que medimos em anos luz. Porém, a grandes distâncias os Campos Magnéticos também têm um papel importante, sendo a segunda força em ordem de importância.

(Talvez o leitor se pergunte porque a força elétrica não é tão importante, apesar de ser mais intensa que a magnética. Acontece que a própria intensidade da força faz com que qualquer desbalanço de carga seja anulado rapidamente. Quando a carga líquida é nula, a força elétrica cesa.)

Os Campos Magnéticos são muito intensos e importantes no Sol e em geral em todas as estrelas. Também encontramos magnetismo nas Galáxias e nos planetas.

Nem todos os planetas do Sistema Solar possuem um campo magnético global. Em alguns casos apresentam um magnetismo remanescente, criado pelo material magnetizado quando se formou o planeta. Por causa dos anos passados, este campo é fraco e está fracionado; cada fração apresenta uma direção distinta. Isto acontece principalmente nos planetas rochosos como Vênus y Marte. Mercúrio, no entanto, é um caso intrigante porque tem um campo global, bastante fraco, cuja origem é diferente à dos outros planetas. Os grandes planetas gasosos, Júpiter, Saturno, Urano y Netuno, por sua vez, possuem intensos campos magnéticos.

O Dínamo Terrestre

A Terra é uma exceção a esta regra. Quando os planetas e as estrelas se formam herdam o campo magnético da nuvem que os forma. O problema é que o campo difunde, de certa forma se propaga para outras regiões, perdendo sua intensidade até que eventualmente se extingüe. Isto pode acontecer num lapso bastante breve da vida de um corpo celeste. Por exemplo, no caso da Terra, entre 20.000 e algo mais de 100.000 anos.

A diferença da força elétrica, que depende da carga, característica da matéria que não muda no tempo, os campos magnéticos somem se não têm um gerador, um dínamo. A Terra, com seus 4,5 bilhões de anos de existência já devería ter perdido todo vestígio de seu campo original. E se não perdeu é porque no seu interior há este gerador.

Um dínamo é um sistema que transforma movimento mecânico em corrente elétrica. O dínamo terrestre é autoexcitado, quer dizer, não precisa de um campo magnético externo. O processo que mantem o campo magnético de forma constante é complexo mas podemos dar as condições necesárias: 1) Rotação diferencial: a Terra não é um sólido rígido, no seu interior algumas camadas têm velocidade angular de rotação diferente e 2) deve existir um fluido condutor de corrente elétrica.

O interior terrestre está dividido em: Crosta, Manto e Núcleo. A Crosta, camada externa da Terra, mede entre 12 e 80 km de espessura. O Manto tem em torno de 3.000 km, costuma ser dividido em interno e externo, este último com características de fluido segundo alguns pesquisadores. O Núcleo tem una extensão de 3.000 km aproximadamente também, sua parte externa é líquida e está formada maiormente por ferro, a região mais interna é sólida. A densidade do núcleo é muito superior à da crosta (que é formada principalmente por granito e bassalto) justificando a elevada densidade média da Terra (5,5 g cm-3). É na camada externa do Núcleo, formada principalmente por ferro líquido, onde se dão as duas condições descritas acima para que se forme um dínamo autoexcitado. Tem um gradiente positivo de temperatura para o interior que produz um movimento ascendente do líquido por convecção, desviado pela força de Coriolis. Ou seja, a diferença de temperatura entre o núcleo e o manto faz o fluido ter um movimento radial (ascendende e descendente) e a força de Coriolis o desvia lateralmente. Todos os movimentos criam correntes elétricas que terminam sustentando o campo magnético. Foi Edmond Halley, o astrônomo que descobriu o mais famoso cometa quem em 1692 propôs que o centro da Terra deve girar 0,5° por ano em relação à superficie para explicar o campo magnético observado. Sua capacidade científica fica evidente ao comparar este valor determinado unicamente por meio de bússolas, com o atual de 0,2° a 0,3° por ano.

O campo magnético terrestre não é muito intenso, no Equador é em torno de 30µT = 0,3 G. Como comparação em Júpiter o campo equatorial é 14 vezes maior (428µT = 4,28 G) e no Sol o campo poloidal atinge os 1000µT ou 10 G, ou seja, mais de 3000 vezes mais intenso que o terrestre!

Inversões Magnéticas

Sabemos que o campo magnético solar sofre a inversão (ou reversão) de sua polaridade a cada 11 anos aproximadamente, devido ao acoplamento de suas duas componentes principais: aquela que vai de polo a polo (poloidal) e aquela que é paralela ao equador (toroidal).

No caso terrestre existe evidência suficiente de que o campo poloidal terrestre inverteu ao longo dos anos mantendo-se sempre quase paralelo ao eixo de rotação, condição necessária para que o modelo de dínamo seja correto. No entanto não se determinou periodicidade alguma, transcorrendo períodos de milhões de anos sem nenhuma mudança aparente. Alguns pesquisadores acreditam que estamos às portas de uma nova inversão. Nos últimos 30 anos foram lançados satélites ao espaço capazes de medir o campo magnético terrestre com precisão e resolução espacial. O que mostram as imagens é que regióes de polaridades contrárias se aproximam dos dois pólos. Os modelos de computador indicam que esta é uma condição necessária para que aconteça a inversão magnética. No entanto os autores dos trabalhos (Gary Glatzmaier da UCLA, e Peter Olson da Johns Hopkins) não podem prever quando efetivamente a mudança virá a acontecer. E além disto, nos modelos a inversão demora 9.000 anos para se completar. De qualquer forma, os estudos do dínamo (terrestre ou solar) estão só nos primórdios. A única forma de se estudá-los é por meio de simulações de computador, mas, por limitações dos processadores atuais, estamos muito longe de produzir modelos realísticos. O parâmetro geral chama-se Número de Reynolds Magnético, RB, número adimensional que mede o grau de turbulência de um fluido magnético. Nos modelos RB é bastante menor que 100, enquanto que no núcleo terrestre deve ser maior que 1.000. Desta forma é difícil fazer previsões. Podemos no entanto afirmar que o campo magnético medido teve poucas variações nos últimos 30 anos, por tanto não há motivos para supor que uma nova inversão possa acontecer nos próximos anos.

É importante observar que quase uma centena de inversões magnéticas nos últimos 70 milhões de anos têm sido descobertas pelos paleontólogos. Nenhuma delas pode ser associada com algum cataclismo, como por exemplo uma extinção massiva de espécies vivas. Também não parecem ter afetado o desenvolvimento do homem, que há 780.000 anos testemonhou a última inversão magnética da Terra.

O escudo magnético

A principal função do campo magnético terrestre não é indicar a direção dos pólos, mas criar um escudo chamado magnetosfera. A magnetosfera é o primeiro escudo contra as partículas carregadas, chamadas raios cósmicos que bombardeiam a Terra de forma permanente. Os raios cósmicos são produzidos fora do sistema solar e também pelo próprio sol. Em qualquer caso é benéfico que não chegem à superfície terrestre porque são perigosos para a saúde. As partículas são desviadas pela força magnética, algunas ficam aprisionadas nos tubos magnéticos até que finalmente caem (precipitam) entrando pelos pólos. Quando muitas partículas entram desta forma producem as chamadas auroras.

No entanto alguns raios são capazes de atravessar a magnetosfera de forma direta, chegando enfraquecidos. Qual é a ação destes raios cósmicos na biosfera é matéria de discusão hoje em dia. Por exemplo existem fortes indícios de que a formação de nuvens é facilitada pela presença de raios cósmicos na atmosfera. Se assim for, as chuvas e a temperatura superficial podem ser influencidas por agentes externos. A magnetosfera é alterada pelo campo magnético solar (chamado de heliosfera) por esse motivo tratamos este tema no capítulo sobre o Sol: Influência da Atividade Solar na Terra: Clima Espacial

Uma Bibliografia Básica

A continuação uma lista de livros e artigos consultados para escrever este capítulo.

G. A. Glatzmaier e P. Olson,Viagem ao Geodíanmo, Scientific American Brasil, 3,36, 32-39 (2005)
P. D. Lowman Jr.,Earth's interior, en la Encyclopedia of Astronomy and Astrophysics, Ed. Nature Pu. Co. e Institute of Physics Publishing, ISBN-10:0333750888 (2001)
K. Moffatt.,Dynamo Theory, en la Encyclopedia of Astronomy and Astrophysics, Ed. Nature Pu. Co. e Institute of Physics Publishing, ISBN-10:0333750888 (2001)
J. W. Kern e E. H. Vestine, Magnetic Field of the Earth and Planets, Space Science Reviews,2,136-171 (1963)



Guillermo Giménez de Castro, sob Licença Creative Commons. Última revisão: 27/08/2011


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